O projeto Telas em Rede chega em mais um território para fortalecer as lutas através do audiovisual. Após a primeira etapa no bairro Perola do Maicá, o projeto desenvolve durante todo o mês de maio a segunda etapa no bairro Vista Alegre do Juá, território fortemente afetado pela especulação imobiliária e que possui história de resistência pelo direito a moradia na cidade de Santarém.
As oficinas de comunicação popular têm foco no audiovisual e durante todo o mês os moradores do bairro participaram de vivências sobre tudo que envolve a produção de um filme. Além disso, muitas rodas de conversas são feitas para entender como eles se enxergam dentro de um bairro que carrega muito preconceito por parte dos poderes públicos e do restante da cidade, e entenderem a importância de se tornarem protagonistas e mostrarem todas as coisas positivas que existem no território do Juá.
O educador Popular (Fase) e coordenador do projeto Yuri Rodrigues, explica sobre a importância da escolha do território, "Esse bairro constitui um histórico muito importante de luta em defesa da moradia, que é um direito básico, e entendemos que a partir desse projeto e da juventude é possível construir uma outra relação do olhar sobre esse território, construir contra narrativas que mostrem as potencialidades que esse bairro tem, de como ele é um lar, de como ele é constituído de pessoas trabalhadoras e que esse lugar também faz parte da cidade. Não podemos restringir o Juá ao olhar da violência, do racismo e da desigualdade, o Bairro Vista Alegre do Juá é muito mais que isso".
A busca pela democratização do acesso ao cinema, principalmente nas periferias da Amazônia, é o que o Telas em Rede busca disseminar, discutindo o racismo ambiental e o olhar de negligencia por parte dos poderes públicos que afetam negativamente a periferia, trazendo a juventude para a partir da comunicação popular se tornarem protagonistas das suas próprias histórias dentro de um território com muita arte e cultura como o bairro Vista Alegre do Juá. "Aqui não é só um bairro onde tem criminalização, é onde eu me sinto acolhida, é onde a minha casa tá. É essencial ter um projeto como o Telas em Rede aqui no bairro porque quando a gente tem uma comunicação pra passar informação certa para as pessoas elas se mantém informada, por exemplo nem todo mundo tem acesso a minha realidade aqui, são pessoas que tem uma visão de fora e se elas escutam só coisa ruim sobre o bairro elas vão acreditar nisso, mas quando eu tomo protagonismo e vou falar da minha
realidade é outra coisa, então dessa forma a comunicação pode trazer outro olhar para as pessoas" afirma Raíra Fonseca, moradora do bairro Vista Alegre do Juá e indígena do povo Arapiun.
O projeto durante todas as atividades no bairro vem dialogando com lideranças da Pastoral do menor, organização que atua junto à comunidade buscando alternativas para fortalecer o bairro e lutar contra as injustiças e desigualdades sociais.
Cinema com celular na Amazônia
Todo o processo das oficinas e atividades giram em torno de desenvolver produções audiovisuais que se encaixem no cenário das periferias amazônidas, com materiais acessíveis como o próprio celular, para que os moradores possam realizar produções de comunicação de onde estiverem com os equipamentos que tiverem.
Todas as atividades são construídas por comunicadores e educadores populares amazônidas da região do Tapajós, entendendo que os moradores desses territórios são os protagonistas das suas próprias histórias e por isso as potencialidades que existem nas periferias devem ser fortalecidas.
O bairro vista alegre do Juá
O bairro é um território resultante de uma ocupação, originada em 2011 e coordenada pelo Movimento dos Trabalhadores em Luta por Moradia (MTLM) por pessoas que eventualmente não possuíam moradia própria e que residiam de aluguel. Com o avanço da especulação imobiliária e os custos de vida ficando desproporcionais a realidade econômica do município, o espaço da cidade torna-se uma mercadoria cada vez mais pensada apenas no lucro, excluindo e segregando pessoas que não conseguem pagar por esse espaço de terra e que precisam de um lugar para morar.
No Plano Diretor de Santarém, criado sob a Lei n° 20.534, de 17 de dezembro de 2018, os Artigos 3° e 4°, propõem os princípios, assim como nas diretrizes diz respeito ao direito à moradia digna. É nesse direito e luta por moradia que hoje existe o bairro Vista Alegre do Juá, a maior ocupação urbana de Santarém em extensão territorial e populacional, onde residem aproximadamente oito mil famílias nos limites da área que corresponde a cerca de 235 hectares. Um local com uma enorme diversidade populacional e de identidades (negros, indígenas e ribeirinhos) que ao precisarem sair do seu território para a cidade encontram no bairro o local de moradia.
Mesmo sendo considerada um bairro devido ao tempo de permanência, ainda não há o reconhecimento na legislação municipal pois o processo de regularização da área ainda não está finalizado. Com isso, os moradores do bairro pouco têm acesso a políticas públicas básicas como saneamento básico, posto de saúde, escolas e creches públicas ou até mesmo a segurança. Além, de todo estigma de violência ligado ao território,
excluindo toda a cultura, arte e riqueza social e ambiental que existe no local, demonstrando claramente o racismo ambiental.
Telas em redeO projeto Telas em Rede - tecendo a comunicação popular nas periferias da Amazônia, é fruto da conexão entre três produtoras audiovisuais: Na Cuia - Produtora Cultural, Negritar Filmes e Produções, e Dzawi Filmes, de Santarém, essa última, tornou- se realizadora do projeto Telas em Rede, na região do Baixo Tapajós.
No ano de 2021, houve a realização de duas vivências sobre audiovisual, sendo uma na Aldeia Vista Alegre do Capixauã (Resex tapajós Arapiuns) e outra na comunidade Vila Brasil (PAE Lago Grande), município de Santarém.
Em 2023, o projeto vem ampliar as lutas da floresta e do campo e unificar às lutas das periferias urbanas. Bem como, fortalecer os laços das comunidades e juventudes por meio de formações em comunicação popular, trocas de experiência e reunir todes em um Festival Cultural das periferias de Santarém. A segunda edição do Projeto Telas em Rede vem sendo realizado via Emenda Parlamentar da Ex Deputada Federal Vivi Reis (Psol), que por meio de diálogos aceitou apoiar o projeto, principalmente por reconhecer que a inciativa tem como foco defender a justiça ambiental, os povos da Amazônia e alcança também as periferias da cidade na luta pela garantia de seus direitos. Por entender que a luta não se faz sozinho, o projeto Telas em Rede tem orientado suas ações juntamente com organizações que tem histórico e reconhecimento de atuação na defesa da região, como a Fase Amazônia, Kitanda Preta, Movimento Negro Unificado (MNU), Associação do Moradores do Bairro Pérola do Maicá (AMBAPEM), Guardiões do Bem Viver, Negrices Caripuna e Projeto Saúde e Alegria.
Fonte: Projeto Telas em Rede